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Fábio de Cristo
"Como será o amanhã?
Responda quem puder.
O que irá me acontecer?
O meu destino será como Deus quiser.”
Assim diz o famoso samba-enredo “O amanhã” (1978), da escola de Samba União da Ilha do Governador/RJ. A canção trata do tema que praticamente todos querem saber. Afinal, como será o futuro pós-pandemia?
Podemos preparar-nos hoje, sem esperar apenas o poder Divino. O Contraste Mental é uma possibilidade para alcançar o que queremos de maneira eficiente. Trata-se de uma estratégia para organizar os pensamentos visando o porvir. Ajuda-nos a escolher uma meta viável, distanciando-nos dos desejos impossíveis, e a mobilizar o ânimo necessário para realizá-la.
O processo é simples. Comparamos/contrastamos dois pensamentos numa sequência. Primeiramente, pensamos onde queremos chegar no futuro (meta desejável) e, em seguida, pensamos nos obstáculos prováveis no presente (experimente listar tudo no papel). Numa metáfora, esse contraste seria como “ajustar as lentes” de uma câmera fotográfica até "encontrar o foco", isto é, definir a meta realizável.
Costumeiramente, todavia, muitos optam por outra estratégia, o “pensamento positivo” exclusivamente. Conforme diz o samba:
“E vai chegando o amanhecer
Leio a mensagem zodiacal
E o realejo diz
Que eu serei feliz.”
Mas, estudos sugerem que ela é bem menos eficaz do que o contraste mental. Em alguns casos, pode ser prejudicial para atingir metas futuras, especialmente aquelas desafiadoras. Ao entregar-se às fantasias positivas por meio da imaginação, sonhando acordado, a pessoa desfruta psicologicamente aquele instante. Sente contentamento, satisfação e prazer como se já tivesse realizado o desejo. Com isso, faltam-lhe o esforço e a energia para continuar buscando por meio de ações concretas.
Pense: quais as consequências, para nós, se gestores/governantes pensarem dessa maneira o futuro (pós-)pandemia? E, em sua vida particular, quais os resultados das metas inapropriadas ou impossíveis que você vem estabelecendo no campo existencial, pessoal, profissional ou familiar? Talvez, por isso, você se tenha desiludido ou até perdido o ânimo pela vida.
É hora de rever metas, de reorganizar-se! O Contraste Mental potencializa nossa capacidade de pensar e de agir rumo ao futuro desejado. Além do pensamento positivo, traz também o senso de realidade com seus obstáculos, a fim de que preparemo-nos adequadamente. Que seu amanhã seja cheio de vitórias, fruto de lutas justas e enobrecedoras hoje.
Para saber mais sobre contraste mental:
Escute o samba enredo aqui.
Dados do autor:
Fábio de Cristo é psicólogo (CRP-17/1296) e professor na FACISA/UFRN. Página pessoal: http://www.docente.ufrn.br/fabiodecristo
Publicado em 10 de julho de 2020.
Fábio de Cristo
Após um dia exaustivo em casa durante a quarentena, eis o que disse um garotinho de quatro anos ao pai, antes de dormir:
“– Amanhã, eu vou me comportar muito bem, você vai ver.”
“– Tá bom, filho. Mas como você vai fazer para isso acontecer?”, perguntou o pai, que logo em seguida, sugeriu: “– Que tal elaborar um plano: SE algo acontecer (um desafio que impeça o alcance da meta), ENTÃO eu farei a seguinte coisa”.
Após pensar alguns segundos, respondeu: “– Se meu irmão (de oito meses) botar meus brinquedos na boca, então vou respirar um pouco pra me acalmar, e não brigar; e, também, se me chamarem para arrumar a bagunça que fiz, então irei colocar tudo no lugar”. Noutro dia, após definir antecipadamente quando e o que fazer, conseguiu, com esforço, concretizar o que era apenas uma intenção.
Essa situação ilustra como poderemos implementar uma mudança comportamental utilizando o planejamento “SE... ENTÃO...”, que é constituído por passos para que você mesmo defina e realize um desejo!
Após definir a(s) meta(s) alcançáveis (“me comportar muito bem”), outras duas coisas devem ser definidas. Para isso, a frase “SE a situação X acontecer, ENTÃO eu farei Y” é útil para estabelecer as situação(ões) crítica(s) impeditivas (a parte SE do planejamento “se meu irmão botar meus brinquedos na boca” e “se me chamarem para arrumar a bagunça”) e, finalmente, para especificar como superá-las (a parte ENTÃO do planejamento, “então vou respirar um pouco” e “então irei colocar tudo no lugar”).
Estudos demonstram que criar esse tipo de plano pode ter grande efeito. Por exemplo, cuidar do meio ambiente, fazer atividade física e alimentar-se de modo saudável. Com o tempo, os novos comportamentos tendem a tornarem-se automáticos, substituindo os anteriores.
Nesta quarentena - e após, quando iniciaremos uma dinâmica social diferente -, as estratégias psicológicas de autorregulação são, e continuarão a ser, de grande valia na implementação de novos padrões de conduta nos diversos ambientes de convivência.
Para saber mais sobre ‘Planejamento Se...Então...’ (chamado tecnicamente de ‘intenção de implementação’ na Psicologia):
Dados do autor:
Fábio de Cristo é psicólogo (CRP-17/1296) e professor na FACISA/UFRN. Página pessoal: http://www.docente.ufrn.br/fabiodecristo
Publicado em 09 de junho de 2020.
Fábio de Cristo
Nos últimos dias, ouvi pessoas dizerem:
– Com tanta gente em casa, fico aborrecido por não ter, neste período, um tempinho só para mim.
– Nessa situação, sinto-me frustrada por não conseguir desenvolver novas ideias ou engajar em atividades criativas, no ritmo que gostaria, relativas ao (tele)trabalho!
São exemplos de como a intensa convivência e as altas demandas no lar (ainda mais em moradias pequenas, com poucos cômodos) têm criado ou intensificado situações emocionalmente perturbadoras nesta quarentena. Elas revelam a necessidade de termos privacidade, isto é, de alcançarmos um nível ótimo de contato interpessoal com as pessoas.
Sem isso, somos menos criativos, temos mais dificuldade de recobrar o ânimo e refletirmos sobre nós mesmos, além de nos afligirmos por não poder compartilhar angústias e segredos em momentos de intimidade.
Buscamos privacidade de variadas maneiras, por exemplo, ao ‘dar uma volta de carro sozinho’, ao ‘passear em lugares sem ser notado’, ao ‘ir para o quarto e fechar a porta’, ao ‘agir reservadamente guardando para si ideias e pensamentos’, ao ‘buscar refúgio num canto para conversar ao telefone’.
Todavia, atualmente, alguns desses comportamentos são (quase) inviáveis, razão pela qual somos impelidos a encontrar novas soluções para continuar regulando 'quem’ terá acesso a nós, a ‘forma’ como isso ocorrerá e por ‘quanto’ tempo.
Mas, como? Dentro do possível, crie pequenas oportunidades, negocie com a família, reveze tarefas com o parceiro, readeque metas com a chefia. Encontre e promova privacidade em benefício da saúde mental de todos! Pequenos momentos poderão ter ainda mais valor em meio ao isolamento social.
Para saber mais sobre Privacidade:
Dados do autor:
Fábio de Cristo é psicólogo (CRP-17/1296) e professor na FACISA/UFRN. Página pessoal: http://www.docente.ufrn.br/fabiodecristo
Publicado em 30 de maio de 2020.
Fábio de Cristo
De repente vizinhos, amigos e familiares estão se comportando de maneira diferente com você. Desviam o percurso para não ir ao seu encontro ou impedem, com gestos, sua aproximação. São exemplos atuais de distanciamento social nesses tempos de pandemia. Distanciamento social é uma das medidas de prevenção contra enfermidades virais, sendo, atualmente, mais do que uma recomendação simples e eficaz dos organismos (inter)nacionais: um dever do cidadão.
Todavia, há “efeitos psicológicos colaterais” capazes de prejudicar nossa saúde mental, podendo agravar o quadro de quem já possui algum transtorno psicológico. Na medida em que evitamos as sensações do abraço, do beijo e do toque, essenciais para nosso bem-estar, experienciamos impaciência, tristeza, crises de choro e solidão com o passar do tempo. Isso porque o distanciamento social, com seu padrão rígido (distância mínima de 1 metro das pessoas) tem substituído uma forma mais espontânea e dinâmica que todos nós já temos: o Espaço Pessoal. Zona invisível ao redor do nosso corpo cuja função é regular o acesso das pessoas, possibilitando variados graus de proximidade. Permitimos, por exemplo, mais aproximação física de familiares do que de (des)conhecidos.
Por enquanto, o distanciamento social serve a um bem maior. Mas, que tal amenizarmos seus “custos psicológicos” ofertando, em vez da indiferença, pelo menos, um sorriso de cordialidade e um olhar de esperança?
Para saber mais sobre distanciamento social e espaço pessoal:
Dados do autor:
Fábio de Cristo é psicólogo (CRP-17/1296) e professor na FACISA/UFRN. Página pessoal: http://www.docente.ufrn.br/fabiodecristo
Publicado em 20 de maio de 2020.
Fábio de Cristo
Há momentos em nossa vida, especialmente em circunstâncias repentinas, como as calamidades e as pandemias, que exigirão alteração do conjunto de nossas condutas pré-estabelecidas, buscando ajustamento. Naturalmente, isso poderá gerar dificuldades, de maior ou menor grau, convidando-nos à mudança de hábitos que regem parcela importante da nossa vida.
Hábitos são respostas automáticas que foram construídas ao longo de repetições bem-sucedidas. Ajudam a aliviar a sobrecarga mental, dando-nos ligeireza nas decisões. Imagine ter de pensar, a todo instante, o que e como fazer as coisas, nos mínimos detalhes?
Os hábitos são difíceis de romper, exigindo esforço e compreensão de nossa parte em face das novas circunstâncias. Por exemplo, relativas à alteração na rotina doméstica; ao convívio com os filhos; à estrutura e à dinâmica do trabalho; à ausência ou ao distanciamento físico daqueles que mais amamos; às proibições de circulação na cidade.
Diante disso tudo pare um pouco! Analise a extensão das ocorrências. Tenha paciência. Trace outros planos e metas acessíveis de mudança, implantando-as paulatinamente. Esforce-se. Construa outros hábitos mais ajustados ao momento. Não será fácil. Obtenha apoio compartilhando dificuldades com amigos e familiares para seguir confiante. Seja tolerante consigo e com os outros. Eles podem estar passando pelo mesmo processo que você; talvez, com maiores dificuldades.
Para saber mais sobre o hábito:
Dados do autor: Fábio de Cristo é psicólogo (CRP-17/1296) e professor na FACISA/UFRN. Página pessoal: http://www.docente.ufrn.br/fabiodecristo
Publicado em 04 de maio de 2020.